Conselho Universitário (Consu) da Unicamp aprovou, nesta quinta-feira (18), a proposta de submissão ao governo do Estado de São Paulo do projeto de autarquização da área da saúde que prevê a expansão acadêmica da Universidade. A reunião foi realizada de forma remota em razão de invasões consecutivas à sala do Conselho, ocorridas nas duas sessões realizadas na terça-feira (16).
Naquele dia, a reunião presencial foi interrompida pela invasão de grupos ligados ao movimento estudantil, por representantes do sindicato de servidores e por integrantes de movimentos sociais. Diante disso, acabou sendo suspensa. No período da tarde, uma nova reunião foi feita, desta vez de forma on-line, também interrompida por nova invasão dos manifestantes.
Por conta disso, a Reitoria marcou uma nova reunião on-line para a tarde desta quinta-feira – que, mais uma vez, foi marcada por interrupções e protestos dos grupos contrários. Apesar disso, o encaminhamento da proposta ao governo foi colocado em votação e acabou aprovado por 41 votos favoráveis, 34 contrários e duas abstenções.
O reitor Paulo Cesar Montagner disse que a proposta de autarquização da área da saúde é essencial para o futuro da Universidade. “Nós não temos outra opção para financiamento do setor de saúde”, disse, pouco antes da votação. Depois de aprovada a proposta, os conselheiros passaram a discutir os pontos da minuta do projeto a ser encaminhado ao governo do Estado para implementação. A adoção do novo sistema também precisa ser aprovada na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).
De acordo com Montagner, a minuta a ser encaminhada ao governo do Estado terá seis pontos fundamentais. O atendimento será 100% SUS (Sistema Único de Saúde); a garantia de que a Unicamp vai indicar os dirigentes da futura autarquia; prevê ainda que o orçamento da Unicamp não poderá ser afetado; e define, também, que o projeto de lei complementar que vai disciplinar o funcionamento do novo órgão terá de garantir os direitos dos funcionários da saúde. A Reitoria se comprometeu ainda a contratar docentes e a negociar com o governo a extensão dessas garantias para os funcionários da Funcamp (Fundação de Desenvolvimento da Unicamp).
A proposta sugere um novo modelo de gestão para a área da saúde – que passaria a ser vinculada à Secretaria Estadual de Saúde para fins orçamentários, mas permaneceria ligada à Universidade no campo do ensino, do treinamento de estudantes de cursos de graduação e pós-graduação e do aperfeiçoamento de médicos.
Hoje, a Unicamp é responsável pelo custeio da área da saúde. Neste ano de 2025, os custos com o sistema deverão atingir aproximadamente R$ 1,1 bilhão.
De acordo com o plano, a expansão – com a criação de novos cursos e abertura de novas vagas no vestibular – seria garantida pelos recursos que a Universidade deixaria de despender com o setor da saúde.
O reitor disse que a proposta é uma saída viável para a retomada da capacidade de investimentos da Universidade. “Da forma como está, não temos mais como crescer”, afirma Montagner. “Este é um projeto de décadas. Um projeto de Estado. O que queremos é construir o futuro da Universidade”, explicou o reitor.
O diretor da Área da Saúde, Luiz Carlos Zeferino, publicou uma “carta à comunidade da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)” nesta quarta-feira (17). Segue a carta na íntegra:
Carta à comunidade da Unicamp
Diretor da Área da Saúde, Luiz Carlos Zeferino, reflete sobre programa de autarquização e expansão da Universidade
Para nos situarmos no tempo, uma proposta de autarquização da área da saúde da Unicamp foi aprovada pela Congregação da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp em 27 de novembro de 2009 e foi aprovada pelo Conselho Universitário (Consu) em 14 de dezembro de 2010. Para chegar até estes dois momentos ocorreram muitas discussões e debates.
Trata-se de um debate promovido pelo Sindicato dos Trabalhadores da Unicamp (STU) acerca da autarquização da área da saúde. À época, o debate foi coordenado pelo servidor e sindicalista João Raimundo (Kiko), hoje aposentado. Eu participei da mesa desse debate, à época, como superintendente do Hospital de Clínicas (HC).
Este registro demonstra, de forma objetiva, que o STU discute esse tema há pelo menos 16 anos, não havendo, portanto, novidade no assunto. Do ponto de vista do sindicato — ao menos sob minha análise —, não importam o conteúdo do projeto, os potenciais ganhos ou a necessidade de se buscar novos modelos de gestão para a área da saúde: a posição é de oposição à autarquização. Assim era em 2009 e assim permanece nos dias atuais.
Querem mais tempo para discutir. Um ano adicional de debate mudaria, de fato, a posição do sindicato? No entanto, as estratégias de atuação do sindicato mudaram — e muito.
O vídeo registra um debate democrático, com a apresentação de diferentes pontos de vista, conduzido por um dos sindicalistas mais sensatos que conheci. Era 2009, também às vésperas de um ano eleitoral.
A propósito, um artigo assinado por Ricardo Viveiros, “Esperança é verbo”, e publicado em 17 de dezembro de 2025, na coluna “Tendências/Debates” da Folha de S. Paulo, surgiu em hora oportuna. O momento atual exige maior seriedade, pois as estratégias hoje adotadas incluem a disseminação de fake news, a distorção deliberada de informações e a invasão de reuniões de colegiados, sempre que os resultados, obtidos segundo regras institucionais e democráticas, não atendem a seus objetivos.
Vamos a um trecho do artigo de Ricardo Viveiros: “O cérebro reage com mais força ao que ameaça; a economia da atenção transforma esse reflexo em negócio; as redes elevam ruído a espetáculo. Resultado: vivemos sob lentes que ampliam o feio e encolhem o que funciona.” Fantástico!
Pois bem! Quando pessoas divulgam que os proventos do décimo terceiro da autarquia de Botucatu não foi pago (fake news), é uma ameaça; quando afirmam que os servidores da Unicamp ou Funcamp serão demitidos (fake news), é uma ameaça; quando afirmam que os servidores da Unicamp irão perder direitos (fake news), é uma ameaça, etc., etc., etc.
Estas mentiras têm mais força e impacto do que a segurança de uma Lei que estabelece que, para os servidores da Unicamp que estiverem atuando na autarquia, estão garantidas todas as conquistas atuais e futuras. Isso inclui os salários e demais vantagens, com a contagem do respectivo tempo para todos os efeitos legais, inclusive para progressão na carreira, mantidos todos os direitos e obrigações decorrentes do contrato de trabalho ou do vínculo estatutário, incluindo férias, licença-prêmio e adicionais, sem prejuízo de outros benefícios previstos na legislação.
Estas mentiras têm mais força do que uma deliberação do Consu que, de maneira autônoma, poderia garantir tudo isso a esses servidores da Unicamp. Têm mais força do que o reitor publicar uma carta comprometendo-se com essas garantias.
O projeto de autarquização apresentado e aprovado pela Congregação da FCM em 2009 e pelo Consu em 2010 (com apenas 05 votos contrários e 03 abstenções) era menos qualificado do que o atual, porém causou muito menos insegurança aos profissionais de saúde e menos dúvidas e questionamentos no âmbito da comunidade da Unicamp. Por que esta diferença tão significativa?
Como escreveu Ricardo Viveiros, “Viralizar mentira custa barato; consertar seus estragos é caríssimo”.
Alguns sugerem esperar o próximo governo para não entregar o projeto de autarquização da área da saúde ao governador Tarcísio, creio eu, para evitar vantagens políticas. Isso posto, entendo que estas pessoas percebem que o projeto tem méritos, mas, por razões políticas, querem protelar seu encaminhamento, alegando que a discussão foi insuficiente ou algo semelhante, mesmo sendo o assunto conhecido e discutido há cerca de 20 anos.
Se a Universidade seguir essa orientação significará adotar uma bandeira política, assunto que nunca foi, nem deveria ter sido pautado na construção deste projeto. Assim, parece-me que a comunidade da Unicamp está submetida a uma estratégia com viés eminentemente de desconstrução do real, com a intenção de provocar insegurança nas pessoas e, consequentemente, reação negativa e até rejeição ao projeto.
Enfim, em última instância, deve caber ao Consu da Unicamp decidir, aprovar ou rejeitar o projeto, de acordo com o senso de cada um de seus membros presentes. Para isso, porém, o Consu precisa se reunir e saber que a sociedade, principal usuária do SUS e financiadora da Universidade, espera de nós o cumprimento do que está legalmente instituído.