Nascido no calor da cafeicultura do século XIX e idealizado como resposta aos problemas técnicos que afligiam a principal riqueza de exportação do país, o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) nasceu por decisão imperial e permanece até hoje como marco científico e arquitetônico da cidade. Fundado oficialmente em 27 de junho de 1887, como Estação Agronômica Imperial de Campinas, o Instituto foi idealizado a partir de uma ação do governo imperial, tendo entre seus “pais fundadores” o imperador D. Pedro II, figura-chave no estímulo às ciências agrárias no Brasil.
A motivação principal era impulsionar o desenvolvimento científico da agricultura, especialmente do café, que era a base da economia brasileira. Havia uma preocupação crescente com a produtividade, doenças nas lavouras e a necessidade de formação técnica para os agricultores”, explica Regina Célia de Matos Pires, pesquisadora e vice-coordenadora do IAC.
A iniciativa representou uma aposta ousada: aplicar o método científico à agricultura tropical. O imperador, que estudava Darwin e frequentava academias científicas internacionais, via, na agronomia, um campo capaz de libertar o Brasil da dependência de técnicas coloniais e de aprimorar o cultivo do café — principal produto de exportação do país. “O Império compreendeu que a ciência era o futuro da lavoura”, escreveria anos depois o agrônomo Franz Wilhelm Dafert, austríaco contratado para dirigir a nova instituição.
Contexto
A gênese institucional do IAC está intrinsecamente relacionada ao contexto econômico da época e a Lei Orçamentária imperial e projetos do Ministério da Agricultura resultaram na instalação, entre 1887 e 1888, de laboratórios, coleções e do edifício-sede — o famoso Prédio D. Pedro II, projetado por Henrique Florence, hoje tombado como patrimônio — localizado no bairro Jardim Guanabara, em Campinas (SP).
A construção, com sua fachada neoclássica e corredores que guardam coleções botânicas centenárias, passou por restaurações nos últimos anos para preservar tanto o patrimônio material quanto a memória científica ali produzida. “Ressalta-se que o IAC desenvolveu as bases da agricultura tropical no Brasil. Assim, todas as demais instituições de pesquisa agronômica que foram criadas encontraram o trabalho desenvolvido e em construção pelo IAC”, aponta a pesquisadora.
A estruturação
O primeiro quadro técnico do instituto reuniu especialistas estrangeiros e nacionais, tendo Dafert como o primeiro diretor-geral técnico do IAC, com a missão de estruturar as linhas de pesquisas, como a análise de solos, caracterização de cultivares e experimentação agrícola voltada, sobretudo, ao café.
Embora nascido de um ato imperial, o IAC passou, em 1892, para a tutela da administração estadual de São Paulo — uma mudança que refletiu a transição político-institucional do Brasil após a Proclamação da República (1889) — mantendo-se, contudo, a vocação científica e a relevância para a economia cafeeira paulista. A partir daí, o instituto se consolidou como referência técnica, ampliando as coleções, estações experimentais e linhas de pesquisa, que perduraram pelo século XX.
Visita do imperador
A presença de D. Pedro II, na história local, não se limita à assinatura de leis. Registros e estudos históricos confirmam a visita do imperador a Campinas em 1886, um ano antes da fundação oficial do IAC, ocasião em que o imperador e a imperatriz, D. Teresa Cristina, receberam homenagens e participaram de atividades culturais e científicas na cidade. Além de um reconhecimento institucional, a ligação do IAC ao nome de D. Pedro II tornou-se um símbolo do projeto modernizador que a ciência representava para o Império.

Legado
Ao longo dos mais de 130 anos de existência, o IAC concentrou coleções arbóreas e herbários, inovou no melhoramento de cultivares (incluindo dezenas de variedades de café) e constituiu um banco de dados vivo sobre solos e plantas de clima tropical e subtropical. Hoje, além das funções técnico-científicas, o complexo serve como equipamento cultural e educativo — promovendo visitas, exposições e ações de difusão científica que lembram suas origens e celebram a arquitetura do Prédio D. Pedro II. Instituições públicas e órgãos de preservação reconhecem sua importância patrimonial e científica.
O IAC completou 138 anos em 27 de junho de 2025, reafirmando a sua relevância histórica e científica como uma das instituições de pesquisa agrícola mais antigas e prestigiadas do Brasil. A data foi celebrada com o anúncio de 20 novas cultivares desenvolvidas nos últimos doze meses da celebração, abrangendo diferentes espécies, como feijão, cana-de-açúcar, citros, batata, batata-doce, milho e painço.
Desmonte
Embora o instituto reúna um histórico extremamente relevante, nem tudo são flores… Há informações e denúncias relativas a ações de desmonte por parte do governo estadual de São Paulo, envolvendo a paralisação de estudos e experimentos por falta de pesquisadores, além da comercialização de áreas usadas para os estudos. Em 2024, por exemplo, um levantamento realizado pela Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) detectou que linhas para o melhoramento de hortaliças, triticale, grão de bico, manga, cacau, trigo, aveia, cevada, mamona, girassol, amendoim e até arroz estavam paralisadas.
Vida que segue…
IAC, com base nas informações divulgadas recentemente, tem como principais linhas e projetos de pesquisa: o desenvolvimento de novas cultivares para o setor agrícola; o melhoramento genético, que é uma das atividades centrais, desenvolvendo, variedades mais produtivas, resistentes a pragas, doenças e estresses ambientais; pesquisa em solos, recursos ambientais e ecofisiologia e serviços técnicos e analíticos, fornecendo análises de solo, apoio para agricultores e transferência de tecnologia para produtores por meio de recomendações de cultivo.
Curiosidades sobre o imperador cientista
O monarca leitor compulsivo – D. Pedro II lia em até nove idiomas (português, francês, inglês, alemão, italiano, árabe, latim, grego e tupi). Mantinha uma biblioteca pessoal com mais de 60 mil volumes, parte deles pertence hoje à Biblioteca Nacional.
Fascínio pela ciência
Foi membro de academias científicas internacionais, como o Instituto Histórico de Paris e a Academia de Ciências de Lisboa. Correspondia-se com cientistas de renome, entre eles Louis Pasteur, Alexander Graham Bell e Charles Darwin.
O imperador da fotografia
Entre os primeiros chefes de Estado do mundo a se interessarem por fotografia, D. Pedro II possuía câmeras e até montou um laboratório fotográfico particular no Paço de São Cristóvão. Incentivou o registro visual das obras e paisagens do Império.
Tecnologia e invenção
Foi um dos primeiros brasileiros a usar o telefone, após receber de Graham Bell um aparelho experimental. Acompanhou também a chegada da luz elétrica, assistindo às primeiras demonstrações públicas do novo sistema.
Viagens e contatos culturais
Visitou países da Europa, o Egito e o Oriente Médio, anotando tudo em diários detalhados. Nessas viagens, reuniu obras de arte, instrumentos científicos e livros que hoje integram acervos de instituições brasileiras e estrangeiras.
Patrono da pesquisa agrícola
Defensor de uma “ciência aplicada ao campo”, apoiou a criação de estações agronômicas, jardins botânicos e museus de história natural.
Simplicidade
Conhecido pela sobriedade, D. Pedro II tinha hábitos simples: tomava café preto, escrevia cartas de próprio punho e gostava de dormir nas redes. Recusou privilégios após a queda da monarquia, morrendo em modéstia, no exílio, em Paris, em 1891.